O cruzeirense não se acha - ele se tem certeza
Fred Melo Paiva
arquibancada.em@uai.com.br
Publicação: 12/11/2011 04:00
Outro dia, apenas para saciar a minha mórbida curiosidade pela desgraça dos outros, entrei nas páginas de um site com noticiário do Cruzeiro. Faço isso uma vez na vida e outra na morte, sempre olhando para os lados, receoso de que alguém me flagre nessa pornográfica situação. Por fim, costumo deixar uma mensagem para o sujeito que faz as contas dos page views: “Desculpe, foi engano. Gentileza desconsiderar esta visita”. Eu é que não vou dar audiência pra esse pessoal.
Mas eu ia dizendo que outro dia então cometi esse negócio de entrar num site do Cruzeiro, e lá estava uma torcedora com um cartaz nas mãos: “Tá bom, eu já entendi o que é ser atleticano. Agora vamos reagir”. Considerei o texto razoável, a vírgula correta e a ideia criativa. Ao contrário do que já se disse sobre Andrés Sanches, pensei: aquela ali devia ter completado o Mobral. E lembrei o meu amigo Kiko, outrora um galanteador, que ao ser apresentado a mulheres cruzeirenses procurava evitar constrangimentos lançando mão de uma tese, salvo engano, cunhada por ele próprio: “Não se preocupe, querida, há uma regra que diz: ‘Toda mulher é cruzeirense, todo cruzeirense é mulher’”. Ótima tese, mesmo correspondendo a uma meia verdade.
Eu poderia ter ficado com raiva da menina do cartaz. Poderia atingi-la com golpes abaixo da cintura, bastando que eu citasse a própria inexistência dessa sua parte do corpo, recauchutada por uns pneuzinhos de SUV. Poderia atacá-la, mesmo vendo pela foto que teria de enfrentar um canhão. Talvez, apenas para matá-la de inveja, eu afinasse. Mas veja como a tabela do campeonato amolece o coração da gente: eu fiquei com pena da menina do cartaz. Uma pena genuína, que quase me faz obrar um daqueles textos-poemas que a crônica esportiva de vez em quando comete: “Ó, menina do cartaz, quem é você? O que te apraz? Uma frase benfeita? Alguma coisa por trás?” Ainda bem que resisti à tentação.
A menina do cartaz diz que já sabe o que é ser atleticano. Coitada: ela certamente entende mais de física nuclear. Se tivesse compreendido um pouco do que é ser atleticano, tratava de repensar a soberba que tanto caracteriza o torcedor do Barcelona das Américas (o catalão que, ele deve pensar, dá nome à avenida). O cruzeirense é aquele tipo muito bem definido pelo Juca Kfouri: ele não se acha – ele se tem certeza.
Ao contrário da menina do cartaz, o Cuca entendeu rapidamente a diferença entre o atleticano e o cruzeirense. E se identificou com a massa. Porque, a exemplo do atleticano, o Cuca é simples: não inventa, escala o que tem de melhor e ponto. Depois de Vanderlei Luxemburgo – o maior erro de Alexandre Kalil e da própria torcida – e de Dorival Júnior, o Atlético parece agora ter um técnico pra valer. Se o Kalil vencer as próximas eleições, tem de fazer como o Cuca: não inventar. Tem de manter uma base, parar de mudar tudo a cada fim de ano. E trazer o Tardelli, pelo amor de Deus.
Restam quatro pontos para o Galo escapar do rebaixamento. Vamos na raça, na força da torcida e na humildade – justamente aquilo que falta à concorrência.
Mas eu ia dizendo que outro dia então cometi esse negócio de entrar num site do Cruzeiro, e lá estava uma torcedora com um cartaz nas mãos: “Tá bom, eu já entendi o que é ser atleticano. Agora vamos reagir”. Considerei o texto razoável, a vírgula correta e a ideia criativa. Ao contrário do que já se disse sobre Andrés Sanches, pensei: aquela ali devia ter completado o Mobral. E lembrei o meu amigo Kiko, outrora um galanteador, que ao ser apresentado a mulheres cruzeirenses procurava evitar constrangimentos lançando mão de uma tese, salvo engano, cunhada por ele próprio: “Não se preocupe, querida, há uma regra que diz: ‘Toda mulher é cruzeirense, todo cruzeirense é mulher’”. Ótima tese, mesmo correspondendo a uma meia verdade.
Eu poderia ter ficado com raiva da menina do cartaz. Poderia atingi-la com golpes abaixo da cintura, bastando que eu citasse a própria inexistência dessa sua parte do corpo, recauchutada por uns pneuzinhos de SUV. Poderia atacá-la, mesmo vendo pela foto que teria de enfrentar um canhão. Talvez, apenas para matá-la de inveja, eu afinasse. Mas veja como a tabela do campeonato amolece o coração da gente: eu fiquei com pena da menina do cartaz. Uma pena genuína, que quase me faz obrar um daqueles textos-poemas que a crônica esportiva de vez em quando comete: “Ó, menina do cartaz, quem é você? O que te apraz? Uma frase benfeita? Alguma coisa por trás?” Ainda bem que resisti à tentação.
A menina do cartaz diz que já sabe o que é ser atleticano. Coitada: ela certamente entende mais de física nuclear. Se tivesse compreendido um pouco do que é ser atleticano, tratava de repensar a soberba que tanto caracteriza o torcedor do Barcelona das Américas (o catalão que, ele deve pensar, dá nome à avenida). O cruzeirense é aquele tipo muito bem definido pelo Juca Kfouri: ele não se acha – ele se tem certeza.
Ao contrário da menina do cartaz, o Cuca entendeu rapidamente a diferença entre o atleticano e o cruzeirense. E se identificou com a massa. Porque, a exemplo do atleticano, o Cuca é simples: não inventa, escala o que tem de melhor e ponto. Depois de Vanderlei Luxemburgo – o maior erro de Alexandre Kalil e da própria torcida – e de Dorival Júnior, o Atlético parece agora ter um técnico pra valer. Se o Kalil vencer as próximas eleições, tem de fazer como o Cuca: não inventar. Tem de manter uma base, parar de mudar tudo a cada fim de ano. E trazer o Tardelli, pelo amor de Deus.
Restam quatro pontos para o Galo escapar do rebaixamento. Vamos na raça, na força da torcida e na humildade – justamente aquilo que falta à concorrência.
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