quarta-feira, 23 de maio de 2012

Sonho para sair do papel


“Se nós juntássemos todas as pedras fundamentais de lançamentos de autódromo em Minas, já teríamos construído a pista.” A frase é de um dos mais destacados pilotos do estado, Toninho da Matta, e espelha a dificuldade para tirar do papel os vários projetos e dotar o esporte mineiro de um espaço apto a receber categorias internacionais e à altura da tradição de nossos representantes em categorias nacionais e internacionais. Não faltaram circuitos de Primeiro Mundo, instalações de cair o queixo, com um problema: nunca deixaram as telas dos computadores para se tornar realidade. 

Um cenário que pode mudar graças a um grupo de aficionados que aprendeu com os erros do passado e pretende ocupar uma lacuna que hoje não é apenas regional. Falta, no Brasil, um complexo com homologação das federações internacionais de Automobilismo (FIA) e Motociclismo (FIM), em condições de receber provas das Superbikes, da Moto GP e que seja alternativa a Interlagos.

Sem grande publicidade, mas um intenso trabalho de bastidores que inclui o estudo dos projetos de circuitos como Sakhir, no Barein, Portimão, em Portugal, Buddh, na Índia, e Dubai, os integrantes do Moto Clube 273 identificaram em Curvelo, Região Central do estado, a 170 quilômetros de Belo Horizonte, o local ideal para a construção de um empreendimento do gênero e as condições adequadas para tirá-lo do papel: um terreno de dois milhões de metros quadrados (o dobro da área do oval de Indianápolis), no quilômetro 608 da BR-135, que liga a capital a Montes Claros e à Bahia. Uma propriedade particular (de um empresário interessado em participar da iniciativa) que respeita todo o tipo de exigência ambiental e permite sonhar longe, já que acolheria, sem dificuldades, um circuito misto, um oval, pistas de kart e motocross, além de um polo industrial, hoteis, condomínio, arena para shows e exposições e mesmo quadras esportivas, escolas e hospitais.

Aí reside o grande diferencial do projeto em relação aos anteriores: se não faltam ideias para dotar a região de um espaço único no país, a ideia é começar de forma modesta e proporcionar um efeito “bola de neve”, com as etapas se sucedendo e novos investidores e parceiros se agregando. De acordo com os primeiros estudos, bastariam R$ 15 milhões (pouco mais de 10% do que foi gasto na reformulação do Estádio Independência, por exemplo) para ter o circuito misto em condição de receber corridas e uma pista de motocross também homologada. Uma estrutura que poderia ser aproveitada também com cursos de pilotagem e eventos de montadoras. 

Como todos as precauções estão sendo tomadas para que o projeto se concretize, ainda não há um traçado desenhado, mas até neste aspecto a iniciativa traz uma inovação. A ideia é ouvir opiniões de pilotos e ex-pilotos – um grupo deles, entre os quais Rafa Matos, Clemente Jr. e o campeão de motocross Jorge Balbi Jr. deve visitar o terreno sexta-feira para opinar e sugerir. A missão de dar formas ao sonho será do arquiteto Humberto Anastasia, apaixonado por automobilismo, respeitando os cadernos de encargos da FIA e da FIM.

PROTOCOLO “Há uma grande demanda por um empreendimento do gênero em Minas e Curvelo acolheu a ideia de braços abertos. O único obstáculo ao sucesso da iniciativa seria a economia brasileira entrar em um momento negativo a médio prazo, algo bastante improvável, já que o país é a bola da vez no cenário internacional. Procuramos estudar o que se fez de melhor pelo mundo, temos uma localização geográfica privilegiada e um terreno que nos permite trabalhar sem restrições e expandir o complexo o quanto quisermos. Mesmo sem divulgá-lo oficialmente, fomos procurados por várias empresas e investidores que enxergaram o potencial e querem conversar. Agora que os primeiros passos foram dados, a tendência é o interesse se multiplicar e rapidamente as etapas se sucederem”, explica o presidente do Moto Clube 273, Flávio Bergmann, que agrega sua experiência na assessoria de imprensa e cobertura dos principais campeonatos brasileiros sobre duas e quatro rodas. 

Na sexta-feira ele assinou um protocolo de intenções com a prefeitura, que se compromete a incentivar e dar sua chancela ao projeto, com impacto estimado em 500 mil pessoas da cidade e dos municípios do entorno. As verbas públicas diretas, no entanto, serão minoria no financiamento das obras, já que o Moto Clube se valerá da Lei Federal de Incentivo ao Esporte para captar recursos. “Não queremos que o poder público gaste um centavo, mas conceda incentivos fiscais ao empreendimento e às empresas que aqui se instalarem, além de colaborar dentro de suas possibilidades.”


MEMÓRIA
Tudo começou em 1949

Se foi necessário esperar até o começo da década passada para que o estado ganhasse seu primeiro autódromo permanente, o Mega Space, em Santa Luzia – que foi inaugurado com um traçado de 1.600m e vai ganhar nos próximos meses uma expansão, passando para 2.450m –as provas de pista no estado são realidade desde muito antes. Em pleno auge da era JK, a então recém-inaugurada Lagoa da Pampulha serviu de cenário para uma corrida que trouxe a Belo Horizonte alguns dos principais pilotos do país na época e foi vencida por Chico Landi, com uma Maserati. Octacílio Rocha não teve a mesma sorte e morreu ao se chocar com um poste. Outra obra na região deu origem a um circuito provisório: de 1967 a 1972 o entorno do Mineirão foi palco de provas que reuniram, entre outros, Emerson e Wilsinho Fittipaldi, Alex Dias Ribeiro, Luís Pereira Bueno, Kid Cabeleira, Toninho e Ivaldo da Matta, em carros de turismo e protótipos. Um dos mais talentosos nomes daquela geração, Marcelo Campos morreu na véspera do GP de 1970, quando testava modificações em seu Puma e bateu numa picape